Em um dia de lágrimas e novas esperanças, 32 estudantes receberam seus certificados no Conjunto Penal de Salvador. A cena, rara, é o retrato de uma política que tenta ressignificar vidas atrás das grades.
A manhã em Mata Escura tinha um peso diferente. Dentro do Conjunto Penal Masculino de Salvador, o ar carregado da rotina prisional deu lugar a um misto de ansiedade e orgulho. Familiares, autoridades e 32 estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA) se reuniram para uma cerimônia que vai além da entrega de certificados. Era sobre reconhecer histórias interrompidas que teimam em ser reescritas.
Helaine Souza, da Secretaria da Educação do Estado, estava lá. Com palavras medidas, mas perceptivelmente emocionada, ela falou de percursos retomados. Para ela, aquele momento simbolizava a articulação de uma rede tênue, porém poderosa: ações pedagógicas, programas de permanência e acesso à tecnologia tentando construir novos projetos de futuro onde a liberdade é uma ausência cotidiana.
A escala do desafio é grande, mas os números mostram movimento. Só em 2025, foram 252 concluintes da EJA espalhados por 12 Territórios de Identidade da Bahia. No total, a rede estadual atende 3.342 estudantes privados de liberdade — uma tentativa concreta de fazer da escolarização um instrumento de inclusão que precede a soltura.
Entre os formandos de Salvador, uma voz se destacava: a de A. S. J., a única mulher do grupo. Seu discurso foi direto. “Somos privados de liberdade e cumprimos pena. Mesmo assim, não perdemos nossa capacidade de sonhar”. Ela falou do conhecimento como ferramenta para abrir portas, mas também de um processo mais íntimo: a chance de reavaliar a própria vida. É uma fala que ecoa no silêncio dos corredores.
Mas será que o estudo, sozinho, basta para frear a engrenagem da reincidência?
Para o governo, a aposta é clara. Bacildes Moraes Terceiro, da Superintendência de Ressocialização, não hesita: a educação é um pilar na prevenção do crime e na humanização. O evento em Mata Escura, portanto, não é apenas uma celebração pontual. É a encenação pública de uma política de Estado — uma tentativa de responder, com diplomas e esperança, a uma pergunta complexa e urgente.
A formatura termina. Os familiares se vão. Os portões voltam a se fechar. Mas algo simbólico fica: a confirmação de que, mesmo nos contextos mais restritivos, o desejo por um futuro diferente não pode ser sentenciado.
