Em cinco anos, os centros de referência da capital baiana registraram quase 50 mil procedimentos. Os dados mostram que a vítima típica é negra, tem entre 40 e 50 anos e vive com até um salário-mínimo — um retrato social que exige políticas urgentes.
O número impressiona: 46.571 atendimentos em cinco anos. São vidas, histórias, coragens reunidas nos três Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAMs) de Salvador. Uma máquina pública que não para — em 2024, foram mais de 14 mil procedimentos; só até outubro deste ano, quase 10 mil.
E os números têm cor, idade e endereço. A maioria das mulheres que chegam aos CRAMs é preta ou parda, tem entre 41 e 50 anos e concluiu apenas o Ensino Médio. A renda? Até um salário-mínimo. São detalhes que transformam a estatística em retrato social — e mostram quem está mais exposta à violência doméstica na capital baiana.
Mas a agressão nem sempre vem em forma de soco.
Os relatos mais frequentes são de violência psicológica (3.050 casos) e de ataques morais (2.711). A física aparece em terceiro, com 2.377 registros. Em seguida, vêm os prejuízos patrimoniais (2.145) e a violência sexual (1.265). São camadas de dor que muitas vezes convivem sob o mesmo teto.
Quando uma mulher atravessa a porta de um CRAM, inicia-se um protocolo de escuta e cuidado. Primeiro, uma técnica faz o acolhimento. Depois, entram em cena psicóloga e assistente social. Por fim, se necessário, o encaminhamento para a rede de proteção — Deam, Defensoria, unidades de saúde. É um caminho pensado para não deixá-la sozinha em nenhum passo.
A secretária municipal de Políticas para Mulheres, Fernanda Lordêlo, lembra que por trás de cada estatística há uma história. “Os CRAMs existem para acolher, orientar e garantir que essas mulheres tenham acesso aos seus direitos”, afirma. E completa, com a seriedade de quem vê a realidade de perto: “É política pública salvando vidas e rompendo ciclos.”
Mas será que a estrutura atual basta?
A demanda só cresce: de 5.206 atendimentos em 2021, saltou para 14.406 em 2024. Um sinal de que a informação sobre o serviço está chegando — mas também de que a violência não dá trégua. As portas estão abertas, o telefone 156 (opção 9) também, e os e-mails funcionam. O desafio agora é fazer com que cada vez mais mulheres conheçam essa rede — e consigam acessá-la antes que a violência escale.
Serviço — Onde buscar ajuda:
— CRAM Loreta Valadares: Av. Tancredo Neves, Caminho das Árvores (Casa da Mulher Brasileira). Telefone: (71) 3202-7396 | cramlv@salvador.ba.gov.br
— CAMSID Irmã Dulce: Rua Léllis Piedade, Ribeira. Telefone: (71) 3202-7399 | camsid.spmj@salvador.ba.gov.br
— CREAM Arlette Magalhães: Rua José Seixas Filho, Fazenda Grande II. Telefone: (71) 3202-7380 | cream.spmj@salvador.ba.gov.br
A cidade que acolhe também precisa ser a cidade que protege. E cada vida importa.
